Por Izabela Baeta
A primeira ideia que me veio à mente quando bateram o martelo na definição do tema da oitava edição da Revista Marta foi o futebol amador feminino e, automaticamente, a possibilidade de explorar o assunto sob um olhar crítico. Para mim, o esporte amador, naquele momento, só me trazia lembranças das imensas dificuldades que já me foram narradas por atletas que praticam futebol de mulheres em BH sem reconhecimento.
Esse pensamento ‘automático’ parece estar conectado até mesmo com a ideia do que significa a palavra amador no conhecimento popular. Muitas vezes, o substantivo é usado como xingamento. Em uma rápida pesquisa, as palavras “inábil” e “incompetente” surgem como opções de sinônimos para “amador”. É como se o lado negativo estivesse implícito na ideia de falar sobre o tema.
Felizmente, esse olhar vai muito mais a fundo. Nas pautas escolhidas para serem tratadas na Revista, o amadorismo é uma veia da paixão latente de quem ama e se dedica ao esporte. Agora, sim, o verdadeiro significado da palavra. “Amador” vem do latim “amator”, que significa aquele que ama; aquele que gosta. Sem fazer com que essa apresentação fique um devaneio poético, quero apresentar que, na verdade, a prática amadora é regada pelos dois lados – o negativo e o positivo.
Deixando para trás a origem etimológica e a noção popular da palavra, o esporte amador vive graças à base de pessoas que não necessariamente querem transformar o hobbie em trabalho – ainda que essa seja a aspiração de alguns. Na maioria das vezes, o amador é uma parte fundamental da transição para o profissional. Em outras, o amador é o lugar de quem quer se desafiar pessoalmente. O futebol de várzea, por exemplo, surge como o pontapé do sonho de meninos e meninas que almejam defender grandes camisas. Para além do futebol, outros esportes amadores são a semente de modalidades que buscam espaço e mais praticantes.
Não é simples ser amador, e nem significa que não há dedicação. É verdade que, pelas condições impostas, as pessoas precisam dividir atenção entre múltiplas tarefas e por isso não podem ter o tempo integral destinado ao esporte. Acredito que daí surge o olhar mais crítico. Em muitos esportes, em razão da falta de incentivo, de patrocínios, de estrutura, os atletas têm que tirar do próprio bolso o básico para atuação. Essa edição procura mostrar justamente isso.
Ainda que alguns dos esportes explorados nas reportagens busquem por espaço, reconhecimento e quebra de preconceitos, também desempenham outro papel importante. São ponto de fortalecimento e fonte de objetivos para atletas, que enfrentam barreiras, mas que realizam sonhos e atingem marcas pessoais. A vivência dos amadores é um choque de realidade em certas modalidades, mas por outro lado, são também incentivos para que outras pessoas comecem a praticar.
Com base nas entrevistas das matérias produzidas, é possível perceber que algumas modalidades ainda vivem na dúvida e no questionamento. “Isso é esporte mesmo?”. Sem incentivo das federações, sem dirigentes competentes, sem reconhecimento de órgãos superiores e sem o conhecimento popular, há resistência. Contudo, a invisibilidade desses esportes complexifica a melhoria das condições físicas e mentais dos atletas e crescimento das modalidades. Não é novidade, mas quantos já desistiram por não terem apoio?
Esse questionamento sempre surge perto dos Jogos Olímpicos. O Brasil poderia ser uma potência se fosse tratado como uma. Quantas Rebecas, Rayssas, Martas, Ítalos, Alissons, Richarlissons já não foram perdidos pelo esporte ser sucateado e desacreditado? Essa discussão pode parecer extrapolar, porque esses são atletas profissionais. Só que, um dia, foram amadores.
Acho que, por fim, é inegável que o esporte amador também ensina, abraça e entende as possíveis adversidades da vida dos atletas – não que eles possam se esquivar das responsabilidades -, mas aqui também é onde iniciam a trajetória esportiva. Então, há lugar para erros, acertos e descobertas. É o que faz a veia dos atletas pulsar em busca de mais, e isso fica evidente em cada história contada nesta edição.
Editores: Ana Carolina Vimieiro e João Vítor Marques
Equipe de reportagem: Jovana Meirelles, Mateus Felipe, Ana Clara Mascarenhas, Lívia Boscatti, Lucas Sant’ana, Laura Parreira, Maria Luiza Moura, Vítor Martins, Ana Paula Andalécio, Brisa Santos, Gabriela Claudino, Amanda Silva e Vinícius Brito
Checagem e revisão final: Izabela Baeta