De vento em popa: Brasil tem altas chances na vela olímpica

País leva 12 atletas. Dentre eles, Martine e Kahena que podem virar as primeiras tricampeãs olímpicas no 49er FX

Por Diego Benjamin Mendes de Carvalho e Mateus Henrique da Silva Vieira

De domingo (28) a 08 de agosto, os velejadores olímpicos competem nas águas mediterrâneas de Marselha, no sul da França. 

Barcos e atletas disputam em um formato de corrida de frota, onde todos eles, classificados por categoria, competem simultaneamente no mesmo percurso com o objetivo de atingir a linha de chegada o mais rápido possível.  Após cada regata da série de abertura, um barco recebe uma pontuação com base em quando cruza a linha de chegada (primeiro = um ponto, segundo = dois, terceiro = três, etc.). Os dez barcos mais bem classificados competem na regata de medalhas. Os pontos marcados são dobrados e adicionados às pontuações da série de abertura para decidir as dez primeiras posições. O barco com a menor pontuação total será coroado campeão olímpico.

A equipe da Revista Marta preparou esse resumo com os detalhes mais importantes da modalidade para te preparar para os Jogos de Paris.

Resumo da modalidade 

A vela estaria presente desde a primeira edição dos Jogos Olímpicos da era moderna em 1896, Atenas. Contudo, as péssimas condições meteorológicas fizeram com que sua estreia fosse adiada para a edição seguinte em 1900, Paris. Desde então, o esporte esteve presente em todas as edições, exceto nos Jogos de St. Louis 1904, com novas categorias femininas, masculinas e mistas entrando e saindo a cada vez. Embora participar da vela olímpica seja ainda muito relevante, há vários velejadores que criticam a presença do esporte na competição. Algumas críticas alegam que o foco principal acaba sendo em “tecnologia” dos barcos, não em “talento” dos atletas.

Apesar da ação de velejar ser comum há milhares de anos, acredita-se que a vela como esporte tenha surgido no século XVII na Holanda e popularizou-se quando o rei Charles II, da Inglaterra, ganhou um iate de presente dos holandeses. A arte da vela esportiva rapidamente se espalhou na Inglaterra e, posteriormente, para as colônias americanas. Por causa disso ela é muito tradicional na Holanda, Inglaterra, Grã-Bretanha e nos EUA mas também na França, Noruega, Dinamarca, Austrália, Espanha, Suécia e até no Brasil, que é destaque na modalidade.

O Brasil possui dois dos melhores velejadores olímpicos do mundo: Robert Scheidt e Torben Grael. Ambos acumulam cinco medalhas olímpicas, sendo duas de ouro. Scheidt também é campeão de 13 mundiais e três pan-americanos, já  Grael conquistou cinco mundiais e um pan-americano. Eles são os maiores medalhistas olímpicos atrás somente do britânico Ben Ainslie. No total o Brasil possui 19 medalhas no esporte, sendo a modalidade esportiva que mais trouxe insígnias de ouro e a segunda maior em medalhas gerais, atrás somente do judô.

A primeira medalha olímpica de vela a ser conquistada por brasileiros foi com Reinaldo Conrad e Burkhard Cordes. A dupla ficou com o bronze na Cidade do México (1968), na classe Flying Dutchman. Alguns outros atletas masculinos que já chegaram ao pódio são Peter Ficker, Reinaldo Conrad, Eduardo Penido, Marcos Soares, Alexandre Welter, Lars Björkström, Daniel Adler, Ronaldo Senfft, Nelson Falcão e Kiko Pelicano. Dentre as mulheres temos Fernanda Oliveira e Isabel Swan com bronze na classe 470 e as últimas bicampeãs do 49erFX Martine Grael, filha de Torben, e Kahena Kunze. 

Outro atleta de renome é Marcelo Ferreira que está no top 15 medalhistas com dois ouros e um bronze. O irmão de Torben Grael, Lars Grael, também já participou das Olimpíadas ganhando dois bronzes, mas ausentou-se após ser vítima de um terrível acidente.

As disputas dos velejadores ocorrem fora da capital francesa. As águas da marina de Marselha receberão os atletas.

Últimos campeões olímpicos

  • Mathew Belcher e Will Ryan  (Austrália) – 470/Masculino
  • Hannah Mills e Eilidh McIntyre (Grã-Bretanha) – 470/Masculino
  • Dylan Fletcher e Stuart Bithell (Grã-Bretanha) – 49er/Masculino
  • Martine Grael e Kahena Kunze (Brasil) – 49erFX/Feminino
  • Matthew Wearn (Austrália) – Laser/Masculino
  • Anne-Marie Rindom (Dinamarca) – Laser Radial/Feminino
  • Ruggero Tita e Caterina Banti (Itália) – Nacra 17/Misto
  • Kiran Badloe (Países Baixos) – IQFoil/Masculino
  • Lu Yunxiu (China) – IQFoil/Masculino
  • Giles Scott (Grã-Bretanha) – Finn/Masculino

Resultados do último ano 

As competições do Campeonato Mundial de Vela 2023 aconteceram nas águas de Scheveningen, bairro da cidade holandesa de Haia.  Aproximadamente 1.400 velejadores participaram do evento buscando uma vaga nas Olimpíadas de Paris 2024. O país anfitrião levou o maior número de medalhas com a dupla Bart Lambriex e Floris van de Werken (49er) e Luuc Van Opzeeland (IQFoil Masculino) levando ouro e a dupla Odile van Aanholt e Annette Duetz (49er FX) com prata. O país com a maior quantidade total de medalhas foi a Grã-Bretanha com cinco medalhas (três pratas e dois bronzes). Um nome de destaque foi o singapurense Maximilian Maeder que vem acumulando ouros no Mundial da Juventude desde 2021 e é bicampeão dos últimos mundiais na classe Fórmula Kite.

Alguns Vencedores/Categoria no Campeonato Mundial de Vela 2023:

  • Laser (Standard): Tom Burton (Austrália)
  • Finn: Giles Scott (Reino Unido) 
  • 49er: Nathan Outteridge e Iain Jensen (Austrália).
  • 470 (M): Anton Dahlberg e Fredrik Bergström (Suécia) 
  • 470 (F): Camille Lecointre e Aloise Retornaz (França) 
  • Nacra 17: Ruggero Tita e Caterina Banti (Itália) 

O Mundial da Juventude da Vela é um evento de destaque responsável por revelar jovens estrelas do esporte. Na edição do ano passado, sediada em Búzios, Rio de Janeiro, o Brasil teve desempenhos expressivos, sendo o maior deles a vitória da dupla Joana Gonçalves e Gabriela Vassel no 420 FEM. As meninas chamaram atenção não somente pelo feito, mas também por ser a mesma conquista das bicampeãs olímpicas, Martine e Kahena, quando participaram do evento em Búzios, em 2009. Apesar do desempenho geral do país ter sido bom (6° colocado no ranking de troféus), a Itália levou a melhor. O italiano que mais chamou atenção foi o campeão mundial e europeu de juventude ILCA 6 de 2023, Mattia Cesana, que continuou seu domínio, garantindo o primeiro lugar no Brasil com 45 pontos. Embora tenha vencido apenas duas das nove corridas, sua consistência impressionante lhe deu uma vantagem de 15 pontos sobre o segundo colocado esloveno Luka Zabukovec, com 60 pontos. Luka conquistou sua segunda medalha de prata no Mundial de Vela Juvenil, tendo conquistado o mesmo prêmio anteriormente em Mussanah, Omã, em 2021.

Joana Gonçalves e Gabriela Vassel no Mundial da Juventude, 2023. Foto: Gabriel Heusi/World Sailing.

O Brasil tem classificados?

Sim, no total o país tem 12 representantes divididos em nove classes: Martine Grael e Kahena Kunze (49erFX), Bruno Lobo (Fórmula Kite), Mateus Isaac (IQFoil),  Marco Grael e Gabriel  Simões (49er), Gabriella Kidd (ILCA 6), Bruno Fontes (ILCA 7), João Siemsen e Marina Mariutti (NACRA 7), Henrique Haddad e Isabel Swan (470 misto).

As classificações dos esportistas de vela ocorrem por meio de cotas concedidas de acordo com os resultados de eventos mundiais, sendo que cada país pode classificar até 14 atletas no total, mas sem mais de um barco por classe. Os eventos são o Campeonato Mundial de Vela de 2023, o Campeonato Mundial da ILCA de 2024, a Regata da Última Chance de 2024 e os eventos de classificação continental 2023/2024. 

Bruno Lobo, Mateus Isaac e Gabriella Kidd conseguiram a vaga pelo Mundial. Martine Grael, Kahena Kunze, Bruno Fontes, João Siemsen e Marina Arndt via Jogos Pan-Americanos. Henrique Haddad e Isabel Swan foram a melhor dupla da América do Sul e Central no Mundial e Marco Grael e Gabriel Simões obtiveram a cota pela Semana Olímpica de Hyères.

Brasil tem candidatos à medalha? 

Sim, o Brasil possui nomes bem promissores na modalidade: 

  • Martine Grael e Kahena Kunze: Bicampeãs olímpicas na classe 49er FX, elas são consideradas fortes candidatas para conquistar o tricampeonato olímpico​ em Paris 2024. Kahena foi campeã do Pan-Americano.
  • Bruno Lobo: Competindo na Fórmula Kite, uma das novas classes olímpicas,  Lobo já obteve bons resultados internacionais e é visto como um potencial medalhista​.
  • Matheus Isaac: Também em uma nova classe olímpica, a iQFoil, Matheus Isaac tem se destacado em competições internacionais como o ouro do IQ Games 2022 e do Pan Americano 2023, garantindo uma vaga para Paris 2024​.

Nos Jogos Olímpicos de Tóquio, as únicas a ganhar foram a dupla Martine e Kahena. Os outros brasileiros com melhor posição foram o duo Ana Barbachan e Fernanda Oliveira (470) em 9° posição e Robert Scheidt (Laser) na 8° posição. Tivemos também Patrícia Freitas (RS:X) e Samuel Albrecht e Gabriela Nicolino (Nacra misto) no 10° lugar. 

Martine Grael e Kahena Kunze na regata da medalha em Tóquio 2020. Foto: Wikimedia Commons.

Destaques da modalidade

Alguns países para manter o olho são a Grã-Bretanha, com 30 medalhas de ouro na vela olímpica,  França, China e Espanha. A equipe britânica para Paris inclui fortes nomes como os medalhistas olímpicos Emma Wilson (iQFOiL), John Gimson e Anna Burnet (Nacra 17), além dos veteranos olímpicos Chris Grube ( Dingy Misto) e Saskia Tidey (49er). 

Nossas representantes Martine Grael e Kahena Kunze (49erFX) tentarão se tornar a primeira dupla a ganhar três medalhas de ouro olímpicas consecutivas. Logo atrás delas estará a equipe holandesa, liderada por Odile van Aanholt, que fez parceria com Annette Duetz para vencer o Campeonato Mundial de 2022. Outros nomes a serem observados são a croata Tonci Stipanovic (ICLA 7), que busca a terceira medalha consecutiva, assim como os medalhistas de ouro de Tóquio 2020, Ruggero Tita e Caterina Banti (Nacra 17), da Itália. 

Martine Grael (à esquerda) e Kahena Kunze (à direita) no Rio 2016, quando ganharam o ouro nas duplas femininas. Foto: Wikimedia Commons.

A medalhista de ouro, Ellie Aldridge, está pronta para ser a primeira representante da Grã-Bretanha no kitesurf, mas é Lauriane Nolot, da equipe francesa, que os especialistas estão apostando para o pódio. Número um do mundo e atual campeã mundial de kitefoil, ela tem uma boa chance de ganhar uma medalha.

Dentre outros grandes destaques da modalidade que estarão presentes em Paris 2024 podemos citar: 

  • Jorge Zarif (Brasil), competindo na classe Finn, também é um dos principais velejadores brasileiros, tendo sido campeão mundial e competindo em várias edições dos Jogos Olímpicos.
  • Lara Dallman-Weiss e Daniela Moroz (EUA) são algumas das principais atletas da equipe americana. Moroz, em particular, é notável por seu domínio no kitesurfing, tendo conquistado vários títulos mundiais
  • Matt Wearn (Austrália), que vai defender seu título olímpico conquistado em Tóquio 2020 na classe ILCA 7 (Laser)​ 
  • Anne-Marie Rindom (Dinamarca) campeã olímpica na Laser Radial (ILCA 6), também estará em busca de mais uma medalha em Paris​

Curiosidades

Na vela é muito comum a hereditariedade. A família Grael é composta por 4 atletas olímpicos: Lars, Torben, Martine e Marco. Juntos eles acumulam 9 medalhas, recorde que pode ser estendido pelos irmãos Martine e Marco esse ano.

Por falar em Lars, em setembro de 1998, ele sofreu um grave acidente quando uma lancha conduzida por Carlos Guilherme de Abreu e Lima invadiu a área de competição e bateu em seu barco, com sua perna direita sendo mutilada pela hélice da lancha. O empresário levou Grael para o hospital, mas não conseguiram reimplantar a perna. O velejador ficou fora da prática esportiva por algum tempo e o caso inspirou-o a fundar junto do irmão Torben o Projeto Grael/Instituto Rumo Náutico, oferecendo cursos de vela para jovens de baixa renda.

No mundo da vela olímpica alguns termos ganham novos significados. Por exemplo, “biruta” é o nome do aparelho que analisa a direção do vento e “compromisso” é quando dois barcos disputam posições lado a lado. Já alguns termos próprios são amura (lateral do barco que leva vento), barlavento (posição onde o vento chega primeiro) e sotavento (posição onde o vento chega depois).

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Autor: coberturaparis2024

Turma de 31 estudantes de Comunicação da UFMG que integram a parceria entre a Revista Marta e a Rádio UFMG para a cobertura dos Jogos Olímpicos de 2024, em Paris.

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