Mudando o mundo a partir do esporte

por Ana Carolina Vimieiro

Em 2020, tive a imensa felicidade de assumir a orientação de TCC das então alunas de Jornalismo da UFMG, Paola Laredo e Viviane Andrade. As duas idealizaram, planejaram e conduziram a primeira edição da Revista Marta, intitulada “Mulher e Esporte”. O intuito era claro: repensar o jornalismo esportivo. O resultado final foi muito elogiado pela banca de defesa composta pelos colegas e referências da pesquisa em Comunicação e Esporte no Brasil, Rafael Fortes e Tatiane Hilgemberg. A importância social da revista foi destacada por uma das idealizadoras do Jornalistas Livres e militante do MST, Ágatha Azevedo, que também participou da avaliação final.

Essa edição tenta fazer jus ao lindo trabalho iniciado pela Paola e pela Viviane, agora numa nova fase da iniciativa. A Revista Marta não podia morrer na sua primeira edição, o que muitas vezes acontece com projetos de fim de curso. A ideia era importante demais. Por isso, e com o apoio próximo de Paola, que continua por aqui, transformamos a revista em projeto de ensino e extensão do Departamento de Comunicação Social da UFMG. A partir desta edição, a Revista será produzida pelos estudantes dos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas da universidade. A edição 2, intitulada “Esporte e Democracia”, é fruto do trabalho árduo e criativo das alunas e alunos que cursam a disciplina de Laboratório de Comunicação e Esporte no semestre 2/2020 (que, em função da pandemia, ocorre majoritariamente no começo de 2021).

E o tema, “Democracia e Esporte”, não poderia ser melhor. Seguimos acreditando que o jornalismo esportivo precisa se renovar. O engajamento na causa antirracista e antifascista de atletas, torcedores e outras figuras ligadas ao esporte em 2020 está aí para nos indicar o caminho. Não é mais possível seguirmos por essa via de um jornalismo esportivo despolitizado, que até pouco tempo parecia incapaz de refletir sobre seus problemas e de cumprir com as funções do jornalismo para o bom funcionamento da democracia. Se no passado víamos a cobertura de questões “sérias” do esporte sendo feita por outras editorias — problema que o pesquisador britânico e radicado na Austrália, David Rowe, aponta como também presente em outros países —, hoje vemos algumas mudanças. Os jornalistas que ouvimos nesta edição estão aí para nos mostrar que é possível fazer diferente. 

Não é fácil. Porque não se trata apenas da vontade dos profissionais envolvidos. Mas nos últimos anos temos razões, sim, para acreditar que algumas coisas estão mudando. Vou citar apenas dois casos que me fazem acreditar. Eles estão ligados às discussões suscitadas pelos inúmeros casos de racismo no esporte visibilizados nos últimos anos. Certamente, há muito a caminhar na cobertura sobre racismo no jornalismo esportivo e Marcelo Carvalho, fundador do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, deixa isso claro na reportagem principal desta edição. Mas me chama a atenção o fato que esses casos repercutiram no próprio jornalismo esportivo, gerando reflexões em diferentes espaços: Júlio Oliveira foi preciso ao dizer no Redação, programa matutino do SporTV, que incomodava olhar o “mar branco” da redação da empresa; em Minas, de onde falamos, Humberto Martins fez uma leitura próxima ao indicar em reportagem sobre racismo no esporte que “o único preto da editoria [do Superesportes] é o que vos escreve”.

Esses são apenas dois dos muitos casos em que temos visto um jornalismo esportivo que não foge das suas responsabilidades e que reflete, inclusive, sobre os seus próprios problemas. Como afirma o professor e pesquisador da UFMG, Pablo Moreno, também na reportagem principal desta edição, é preciso, antes de tudo, reconhecermos que a mídia brasileira é racista para pensarmos numa mídia antirracista. Estendo a mesma observação para a mídia esportiva. É preciso reconhecermos que a mídia esportiva brasileira é racista para vislumbrarmos algum caminho para que ela se transforme numa mídia comprometida com a luta antirracista. Digo mídia para ampliar o problema para além dos muros do jornalismo esportivo. Ele está também na publicidade esportiva e na comunicação de várias instituições esportivas brasileiras.

Sobre o jornalismo esportivo, sim, ele é ainda hoje predominantemente feito por homens cis héteros e brancos, diz Tatiane Hilgemberg em reportagem desta edição. Para complicar, Breiller Pires, jornalista dos canais ESPN, completa: são muitos de origem privilegiada, fazendo das redações esportivas lugares pouco diversos. Não à toa, historicamente, o jornalismo que delas saiu é também tão pouco diverso. Só falamos dos resultados dos jogos de futebol profissional masculino. Primordialmente, na mídia que se diz nacional, dos times do Rio e de São Paulo. Ouvimos poucas fontes e as poucas que ouvimos são todas “internas” ao futebol. Não sou eu que digo isso. São as pesquisas: a International Sports Press Survey de 2011 ou trabalhos mais recentes como o de Valquiria John, de 2014, o de Everton Cavalcanti e André Capraro, de 2014, ou ainda a análise de Pedro Vasconcelos, de 2020. Há muito o que se renovar e inovar no jornalismo esportivo. 

Completam o cardápio de reportagens produzidas por esses que serão, queremos, o futuro da mídia esportiva brasileira: 

Finalizo esse editorial com esse expediente fantástico, que, como apontei, é o futuro da comunicação esportiva no Brasil:

Editora-chefe: Ana Carolina Vimieiro

Chefes de redação: Paola Laredo e André Quintão

Equipe de reportagem

Pautas/Produção: Antônio Moraes de Paiva, Gabriel Douglas de Souza Almeida, Janaína Barbosa de Almeida, Beatriz Kalil Othero Fernandes e David Pedra

Podcast: João Vitor Ameno Farinelli, Rani Costa Fernandes, Yves Vieira Menezes e Alice Queiróz

Audiovisual: Maria Carolina Gonçalves Martins de Andrade, Sofia Leão, Rafael Esposito e Diego Silva Souza

Texto: Wander Soares, Samuel Vieira Rangel Trindade dos Santos, Samuel Resende, Natália Oliveira Souza, Giovana Maldini Souza do Carmo e Nathália Araujo

Fotografia: Cássio Lima, Luiza Galvao, Giovana Fiuza Guimarães e Gabriela Falcon

Infografia: João Francisco Ribeiro de Almeida Júnior

Checagem e revisão final: Matheus Ferreira Martins Miguel e Larissa Marques Oliveira

Equipe de design: Sabrina Costa e Maria Nathalia Tavares

Equipe de comunicação institucional: Pedro Lucio Paiva, Lívia Oliveira Boscatti e Sarah Nicoli

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