por Antônio Santos, Vinícius Morais e Rafaela Lacerda
Oito anos atrás, no fatídico 8 de julho de 2014, a Seleção Brasileira sofria em casa uma derrota lamentável para a Alemanha durante a Copa do Mundo FIFA daquele ano. A partida da semifinal contra a Alemanha se tornou um marco negativo na história do esporte e se agarra à memória de todos os torcedores brasileiros desde então – muitos dos quais tinham mais do que crença, mas certeza de que o hexacampeonato viria em casa.

A goleada sofrida pelo Brasil, um placar ultrajante de 7×1 para os alemães, foi incorporada pelo linguajar popular e passou a descrever desde pequenos infortúnios do dia-a-dia até situações de maior proporção, virando termo de uso comum: Todo dia um 7×1 diferente. Para a seleção mais vitoriosa na história da Copa do Mundo, a única detentora do pentacampeonato e presente em todas as edições desde 1930, ser derrotada por uma diferença avassaladora de gols jogando em território nacional – e em um momento de crise política e social -, abalou profundamente a confiança dos torcedores na seleção, que deixou de demonstrar em campo técnica e habilidade e passou a ser recorrentemente criticada por posturas até mesmo fora de campo, como em questões políticas, algumas das quais se estendem até os dias atuais.
Popularmente, o povo brasileiro é descrito pela superação de constantes “derrotas” e tristezas em seu cotidiano. Adaptável, parece não haver desafio, dor ou dificuldade que não possa ser processada e deixada para trás. No entanto, existe mesmo (ou existirá) uma total superação da vergonha sofrida em solo nacional frente à Alemanha do técnico Joachim Löw durante a Copa do Mundo? A única certeza é que o momento foi motivo de tristeza para milhões de apaixonados pelo futebol que acompanhavam a partida sem realmente acreditarem no que estavam presenciando.
O palco da tragédia foi o Estádio Governador Magalhães Pinto, mais conhecido como Mineirão, localizado na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais. Trata-se de um dos maiores templos do futebol sul-americano onde ocorreram momentos históricos do futebol brasileiro, como a conquista da Libertadores pelo Clube Atlético Mineiro, em 2013, e a conquista da Taça Brasil pelo Cruzeiro Esporte Clube, em 1966, em cima do Santos de Pelé. Em razão da importância do estádio, o episódio ficou conhecido para muitos como Mineiraço (ou Mineirazo, em referência à derrota para o Uruguai na final da Copa do Mundo de 1950, evento que, para os sul-americanos, é lembrado como Maracanazo, ou Maracanaço, em português).

O drama sofrido pela Seleção teve início aos 11 minutos do primeiro tempo, com um gol do meia atacante Thomas Muller, na época com 24 anos, e daí se seguiu o massacre: somente no primeiro tempo a Alemanha abriu vantagem de cinco gols, dentre os quais estava o marcado por Miroslav Klose (16), que viria a destronar Ronaldo Fenômeno (15) como maior artilheiro da história das Copas do Mundo Masculina; Toni Kroos balançou as redes duas vezes e Sami Khedira fechou a conta. No segundo tempo, após suposta instrução para “tirarem o pé” contra o Brasil, somente duas finalizações foram para o fundo da rede, ambos marcados por André Schurrle. O Brasil teve a chance de fazer seu gol “de honra” pelos pés de Oscar, aos 45 do segundo tempo, mas já era tarde demais.
Em 2022, na segunda Copa após o trágico ocorrido, a seleção canarinho foi em busca de reacender a paixão brasileira pelo time. A luta para conquistar a sexta estrela teve fim nas quartas de final da Copa do Catar, palco da 22ª edição do campeonato, pela primeira vez realizada em território árabe.
Após a fase de grupos e o bom desempenho do time brasileiro na Copa do Mundo FIFA do Catar, uma pergunta permanece: brasileiras e brasileiros já superaram o 7×1?
Na tentativa de construir uma resposta para essa pergunta, durante a Copa de 2022, ouvimos a jornalista Cler, que presenciou ao vivo no Mineirão o episódio da seleção brasileira; a psicóloga esportiva Paula de Paula, professora da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas); e diversos frequentadores da Esplanada do Mineirão, numa oportunidade de ouvir o que pensa o público não especializado e quais indícios para responder a pergunta.
O que o público geral pensa?
Camila, 30 anos, professora
Para a professora Camila (30), acompanhar a Seleção é um costume que a acompanha desde criança e foi mantido durante os jogos no Catar. No entanto, ela alega ter percebido em seu ciclo social a diminuição das expectativas depositadas na campanha rumo ao hexa, principalmente pelo impacto deixado pela derrota em 2014.
Gabriel, 16 anos, estudante
Gabriel ainda era muito novo no fatídico dia, mas presenciou dentro do Mineirão o passeio alemão para cima do Brasil. Após o trauma, ele alega ter passado um tempo sem acompanhar os jogos, mas já recuperou o ânimo e voltou a acreditar nos resultados e alegrias que a Seleção pode proporcionar.
João Pedro, 14 anos, estudante
João Pedro é o mais novo dos entrevistados e tinha somente seis anos durante a Copa do Mundo no Brasil. Ele reforça como a relação dos torcedores com a Seleção foi afetada após a derrota, mas passados oito anos, o legado negativo parece estar superado e a boa fase na temporada é um dos motivos para a torcida ter sido restabelecida.
O que pensa quem presenciou o 7×1 ao vivo?
“Quando o jogo começou era cantar hino toda hora, bater palma […] todo mundo conectado […] até o terceiro gol o pessoal ainda tava aquecido, com uma leve esperança, quando chegou no quarto deu uma morrida, as pessoas realmente largaram mão.”
Cler pereira, 21
Cler dos Santos Gomes Pereira tem 21 anos, é estudante de jornalismo e atua no jornal Estado de Minas. Faixa preta em Taekwondo e atleticana desde pequena, sempre esteve muito ligada ao futebol. Em 2014, após vencer um sorteio, a mineira teve a chance de acompanhar in loco a tão esperada semifinal entre Brasil e Alemanha.
Movida pelo patriotismo que tomou conta das suas expectativas antes do jogo, a torcedora infelizmente não conseguiu acompanhar a partida toda. Ela tentou se manter firme até o fim do jogo, mas talvez as principais lembranças ainda são as lágrimas de toda a torcida.
Apesar de ter sua a confiança na seleção minada em 2018, ela entende que essas tragédias acontecem e pessoalmente superou o trauma, mas não acredita que os torcedores em sua maioria tenham realmente deixado para trás o baque que foi aquele 8 de julho no Mineirão.
Qual é a visão da psicologia esportiva sobre o 7×1?
Paula de Paula, ex-professora de educação física e ex-atleta de voleibol, trabalhou no Atlético por 10 anos como psicóloga e atualmente é coordenadora da Comissão de Psicologia do Esporte do Conselho Regional de Psicologia e professora da PUC Minas.
Em conversa com a Revista Marta, ela discorreu acerca das suas impressões quanto às expectativas do torcedor brasileiro antes do jogo contra a Alemanha, a humilhação sofrida pelos jogadores da Seleção Canarinha após as orientações para que nossos algozes “tirassem o pé” na partida, e a falta de respostas para tudo que aconteceu naquela semifinal, registrada principalmente no choro para toda a nação do zagueiro David Luiz.