por Giovana Maldini, Maria Carolina Gonçalves e Rafael Esposito
Há quem acredite que o futebol está em uma bolha, isolado de todos os problemas sociais, questões políticas e desigualdades. No entanto, a modalidade, por estar inserida em uma sociedade, reflete questões presentes nela e, por vezes, legitima a continuidade de alguns impasses como forma de tentar preservar a tradicionalidade do esporte.
Um dos principais exemplos é a violência presente nos estádios contra pessoas que quebram com a normatividade heterossexual e machista imposta para a modalidade: mulheres e público LGBTQIA+. Isso porque está historicamente enraizado que o futebol não é destinado a esses grupos, o que torna o estádio um local pouco acolhedor a eles. As formas de violência de gênero se manifestam como uma reafirmação da masculinidade de torcedores, que consideram o estádio um espaço livre para se expressar e propício para a constante afirmação de seu lugar enquanto homem hétero. Mas, atualmente, algumas iniciativas de clubes e grupo de torcedores tentam conscientizar sobre as formas de violência de gênero no futebol, na tentativa de tornar o estádio um espaço mais democrático e seguro a esses grupos subalternizados.
A psicóloga e professora, Marina de Mattos Dantas, que também é pesquisadora do Grupo de Estudos sobre Futebol e Torcidas (GEFuT/UFMG) e do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Social do Esporte (GEPSE/UFMG), conta como e por que essas violências de gênero são recorrentes nos estádios historicamente. Ela também destaca o papel de clubes e da mídia em evitar esses problemas no esporte.
Mulheres torcedoras
Dentro e fora dos estádios, mulheres apaixonadas por futebol são constantemente agredidas. Além do assédio, que é frequente principalmente em dias de jogos, as opiniões das torcedoras são muitas vezes deslegitimadas por homens. Isso é relatado pela professora Aline Medeiros, torcedora fanática do Atlético Mineiro e integrante do coletivo feminista de torcedoras do Galo (Grupa). Ela conta que por ser também comentarista na Rádio da Massa (90,3 FM) e no canal do YouTube Linha de Três, a violência simbólica contra as mulheres que debatem futebol é rotineira.
No entanto, mesmo com todos os problemas enfrentados como torcedora e comentarista, Aline conta que não deixa de ir ao estádio e nem de expressar suas opiniões e análises sobre o Atlético Mineiro.
“Eu nunca deixei de ir maquiada, se tiver calor eu vou de short. Já escutei muitas amigas falarem que não vão ao estádio porque tem medo. Se eu deixar de fazer as coisas por medo, eu não faço nada. E o Atlético é uma das coisas que eu mais amo na minha vida, então eu não vou deixar de ir ao estádio”, conta Aline.
Aline medeiros, professora e comentarista esportiva
Mulheres no jornalismo esportivo
As vítimas de assédio nos estádios não se limitam a apenas torcedoras. Muitas jornalistas esportivas também são alvos de violência no seu próprio ambiente de trabalho, seja por assédio de torcedores e colegas de profissão, seja por descredibilizar sua atuação como especialista em esportes.
A pesquisa “Mulheres no jornalismo brasileiro”, feita em 2017 pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), mostrou que mais da metade das jornalistas entrevistadas relataram ter presenciado ou souberam de uma colega sendo assediada durante o exercício do trabalho. Além disso, 67% afirmaram que sua competência foi questionada por colegas ou superiores.
No esporte, esse cenário não é diferente. A jornalista Rebeca Braga conta suas experiências no estádio durante o processo de produção do TCC sobre mulheres torcedoras e no exercício de sua profissão como jornalista.
“Ser mulher no estádio, tanto como torcedora ou como jornalista, é complicado. Nunca estamos blindadas de sofrer assédio ou algum tipo de violência”, afirma Rebeca.
rebeca braga, jornalista
Torcedores LGBTQIA+
Outro grupo também alvo de violência de gênero por parte dos torcedores é o público LGBTQIA+. Além de agressões físicas contra essa minoria, cantos homofóbicos entoados pelas torcidas dos times brasileiros também são uma forma de ataque e opressão.
João, que é fundador do PorcoÍris, grupo de torcedores LGBTQIA+ do Palmeiras, conta que nunca sofreu violência no estádio, mas acredita que é um ambiente hostil para mulheres e para pessoas LGBTQIA+.
“Nós do PorcoÍris acreditamos que a inclusão, por parte dos clubes, jogadores e torcedores, é a melhor forma de combater o preconceito e a lgbtfobia. A inclusão é muito importante porque naturalizaria. É um papel fundamental dos clubes, das confederações e federações regionais fazerem postagens e lembranças sobre a comunidade LGBT, falando da importância da inclusão para o fim do preconceito”, explica João.
fundador da torcida organizada porcoìris
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